Carla Diaz, Leonardo Bittencourt, Mauricio Eça e Raphael Montes falam ao g1 sobre gravação em 33 dias de dois filmes ao mesmo tempo e recomendam ordem para assistir.
Fazer um filme no Brasil não é fácil. É por isso que, quando foi anunciado que “A menina que matou os pais” se dividiria em duas produções gravadas ao mesmo tempo, a expectativa pela adaptação cinematográfica da história de Suzane von Richthofen se tornou uma das maiores dos últimos anos.
Este é, afinal, um dos crimes reais mais infames da história recente do país. E agora o público, que cresceu horrorizado com o assassinato de Mandred e Marísia von Richthofen em 2002, ganharia não apenas uma oportunidade para entender melhor o que aconteceu, mas duas. Relembre o caso.
E quem assistir a “A menina que matou os pais” e “O menino que matou meus pais”, que estreiam juntos na plataforma digital Prime Video na última sexta-feira (24), vai encontrar até mais.
“A gente fala que no final acabou criando e interpretando três personagens”, conta em entrevista ao g1 Carla Diaz, atriz que vive Suzane nas produções.
“Porque a gente tá falando sobre dois filmes que abordam o mesmo assunto sob dois olhares diferentes. Só que em um deles a gente também tem a versão no tribunal, onde a gente narra a história anos depois. A personagem muito mais velha, depois de presa. Então, acaba sendo uma outra perspectiva. Com certeza foi um grande desafio.”
Depois de começar a carreira ainda bebê, a atriz ficou conhecida por atuações em “Chiquititas” e na novela “O Clone”. Mesmo trabalhando há 29 de seus 30 anos, ela diz que nunca viveu algo como gravar dois filmes ao mesmo tempo ao longo de 33 dias.
“No set, a gente tinha que gravar, no mesmo dia, às vezes cena dos dois filmes. Era misturado. Então, a equipe precisou de muita concentração, muito foco, para ter essas mudanças.”
Ela disse, ele disse
Cada uma das produções se baseia nos depoimentos de Suzane e de Daniel Cravinhos, seu namorado na época e também condenado pelo crime, durante as investigações e o julgamento.
Enquanto “O menino que matou meus pais” segue a versão de Suzane sobre como conheceu Cravinhos e se deixou influenciar por um jovem possessivo e ambicioso, “A menina que matou os pais” retrata o relato dele, no qual a mentora do crime é uma jovem infeliz com a família, manipuladora e potencialmente abusada pelo pai.
“Eu costumo falar que é muito de domínio. Em um, um personagem domina mais. No outro filme, ele é mais dominado”, afirma Leonardo Bittencourt (“Malhação”), responsável por interpretar as versões de Daniel.
“E, de início, pode parecer mais chocante essa gravação de cenas espelho, que são duas cenas de versões diferentes. Mas depois de um tempo para mim era a melhor coisa, porque me ajudava a ter a referência dos dois extremos. Eu saberia como é que as duas coisas estão sendo contadas nessa altura da história.”
Leonardo Bittencourt, Carla Diaz, Leonardo Medeiros, Vera Zimmermann e Kauan Ceglio em ‘A menina que matou os pais’ — Foto: Divulgação
Como um se tornou dois
Quando foi anunciado em 2018, o projeto contava com apenas um filme. Mauricio Eça tinha dirigido o clipe de “Sou a Barbie Girl”, de Kelly Key, e os dois filmes da novela “Carrossel”, mas deseja há tempos levar a história dos von Richthofen aos cinemas.
Com a ajuda do produtor Marcelo Braga (“A garota invisível”), ele buscou a criminóloga Ilana Casoy, autora do livro “O Quinto Mandamento – Caso de Polícia”, sobre o assassinato do casal.
Em parceria com o escritor de livros policiais Raphael Montes (“Bom dia, Verônica”), ela se debruçou novamente sobre os autos do processo e chegou a um roteiro divido em duas partes. A primeira com a versão de Daniel. A segunda, com a de Suzane.
A ideia já era rara e seguia moldes de filmes como o francês “Bem me quer, mal me quer” (2002) e do clássico japonês “Rashomon” (1950).
Quando Diaz ficou sabendo da produção, as buscas pela atriz para o papel durava cerca de um ano. Em seu anúncio como a protagonista, ainda havia um só roteiro.
Foi o produtor Gabriel Gurman, da Galeria Distribuidora, quem leu o texto e deu início à discussão de transformar aquilo em dois filmes distintos.
Por isso, a equipe jogou fora a estrutura anterior e concluiu que seriam necessários dois roteiros.
“Eu acho que isso foi feito muito porque a gente percebeu como era importante a gente tratar de maneira igualitária sobre as duas versões”, diz Montes.
“A gente não sabe qual é a verdade, por isso era importante a gente ser imparcial nessa apresentação. Então, a gente tem dois filmes com duração de 80 minutos apresentando cada uma.”
Isso influenciou até na linguagem das produções. Depois de flertar com a ideia de gravar com olhares diferentes cada uma delas, Eça escolheu por técnicas iguais para ambos.
“São dois filmes iguais. É o mesmo fato. O mesmo caso. O que vai diferir são os pontos de vista. Mas eu não posso roubar de um lado ou de outro”, conta o cineasta.
“Não posso fazer o espectador sentir de forma diferente. Quem rege a forma como cada filme é narrado é o próprio depoente de cada filme. Cada um tem um ritmo diferente por causa de como cada um contou a história.”
Qual ver primeiro?
Nesse caso tão incomum, o espectador pode ficar confuso em relação a qual dos dois deve assistir primeiro.
Para confundir ainda mais, a pandemia adiou o lançamento do projeto e com isso eles ficaram de fora dos cinemas – algo que pode ser frustrante, mas que também oferece a oportunidade de maratonar tudo de uma vez ou então ver aos poucos.
Há, então, uma maneira ideal de assistir às histórias? Diretor e roteirista dizem que a decisão é do espectador, mas também chegam à mesma indicação.
“Isso é muito pessoal. Até porque a gente já viu diversas vezes em ordens distintas. Eu hoje te diria para ver primeiro o ‘O menino que matou’ e depois ‘A menina’. Seria a ordem que eu aconselharia. Mas não tem ordem. O importante é ver os dois”, aconselha Eça.
“Talvez seja legal ver maratonando. Talvez seja interessante deixar um dia para respirar, porque em um dia você está com a visão de um deles e pensa: ‘nossa, isso faz sentido’. E daí no dia seguinte você vê a outra visão que desconstrói tudo o que tinha entendido até então”, acrescenta Montes.
“Eu mesmo já mudei de opinião algumas vezes. Joga na moeda, mas assista aos dois.”
FONTE: Por G1