Os guardas municipais de Manaus serão armados com pistolas semiautomáticas calibre 9mm. Sem licitação, as armas serão compradas da empresa Taurus por R$ 895.712,50.
A aquisição consta em na Portaria nº 032/2021-DAF/CM publicada no Diário Oficial do Município de quinta-feira (16). A portaria não estabelece o número de pistolas a serem adquiridas. O documento contraria discurso do prefeito David Almeida (Avante) sobre doação de armamento pela Secretaria de Segurança Pública do Amazonas.
A autorização para a compra ocorre três meses depois de a Assembleia Legislativa do Amazonas aprovar PEC que liberou o uso de arma de fogo para a Guarda Municipal, ocasião em que David Almeida anunciou que o armamento seria adquirido por meio de “doação” da SSP-AM. “Serão requisitadas as armas usadas pelos policiais civis e militares”, disse.
Almeida anunciou, na época, que “já existe uma negociação com o (ex) secretário de Segurança Louismar Bonates (já exonerado), que se prontificou a fazer uma boa doação de armas, dessas pistolas que eles usam atualmente”.
Inicialmente, a doação do armamento serviria para o treinamento da guarda. “Nós vamos armá-los com o que há de melhor, com armamento pesado, para eles estarem preparados para o combate caso tenham um confronto”, afirmou o prefeito na época.
Na quinta-feira da semana passada o secretário municipal da Casa Militar, William de Oliveira Dias, que assina a portaria, autorizou o processo de aquisição sem concorrência pública. William discrimina o produto como sendo “pistola semiautomática, calibre 9 mm” e considera a “inviabilidade de competição” para a dispensa de licitação.
A Taurus Armas, com sede no Rio Grande do Sul, é a única fabricante no país do modelo escolhido pela Casa Militar.
Procurado, William de Oliveira, evitou dar esclarecimentos. No primeiro contato com a reportagem para tratar da aquisição das armas, o secretário pediu que a demanda fosse levada à assessoria de imprensa. Depois, alegou que estava acompanhando a agenda do prefeito, mas que poderia falar em seguida. Contactado novamente, pela quarta vez, ele afirmou que em 15 minutos daria um retorno, o que não ocorreu. O secretário não atendeu mais as ligações.
Letalidade
O armamento da guarda municipal já é uma realidade em outras três capitais da região Norte. Belém (PA) é a que possui efetivo mais estruturado, o Grupamento de Ações Táticas, e conta com, pelo menos, sete tipos de equipamentos letais e não-letais. Palmas (TO) e Boa Vista (RR) são as outras duas cidades do Norte onde os guardas têm armas de fogo. Nas outras capitais, ou os guardas trabalham armados – no caso de Macapá (AP), ou não existe – Rio Branco (AC) e Porto Velho (RO).
Em Belém e Boa Vista há a prevalência de revólveres calibre 38. A guarda da capital paraense dispõe de armas letais (revólver calibre 38, espingarda calibre 12 e pistola 380) e armas não-letais (AM 600, utilizada com munição de bala de borracha, granadas de efeito moral, granada de gás lacrimogêneo e spray de pimenta). Em Boa Vista, os servidores manuseiam pistolas 380, revólveres calibre 38 e espingardas calibre 12.
Alto poder de fogo
Em Manaus, a compra da pistola semiautomática de calibre 9mm para a guarda gerou divergências entre os especialistas ouvidos pelo ATUAL. Um é sargento da Polícia Militar e outro, investigador da Polícia Civil. Ambos são da ativa e pediram para não terem a identidade divulgada.
O PM avalia que a aquisição de uma calibre 9mm gera ainda mais insegurança quando incorporada ao efetivo urbano. “Na minha opinião, o calibre 9 mim não é adequado para usar em cidades pelo fato de ser transfixante, ou seja, uma única bala atravessa o corpo humano e atinge quem estiver atrás”.
O militar explica que a aquisição de um revólver calibre 38, por exemplo, seria mais bem aproveitada. “(com esse modelo de arma) A pessoa atingida cai e o projétil (bala) fica no corpo da pessoa. A ponto 9 não derruba a pessoa com o impacto”, explica. “A calibre 9mm é usado para a guerra. As forças armadas utilizaram bastante tempos atrás”, completou.
Em contrapartida, o investigador da PC afirma que a lesão transfixante “não existe” e que não há como saber quando uma bala vai ou não atravessar um corpo humano ao ser disparada. “Já há estudos que evidenciam isso”. Para ele, a aquisição do executivo municipal foi “bem pensada” e “está a frente até do equipamento que as polícias no Amazonas utilizam hoje, que é o calibre 40mm”.
“O calibre 9mm é um projétil menor, exige menos carga e o recuo na mão o coloca no nível 2. Então ele é menos letal que o .40 devido ao recuo da arma”, ou seja, nesta última, o policial demora a disparar e consegue dar, no máximo, quatro tiros. Enquanto que com a .9, o desempenho duplica. Para o policial civil, isso facilita as abordagens em casos de confronto imediato. “Polícias do país inteiro, como o grupo FERA, já dispõem dessa arma”.
FONTE: AMAZONAS ATUAL