Apresentador é investigado por ter defendido existência de partido nazista no Brasil durante programa de entrevistas na internet em fevereiro. À época, ele alegou que havia bebido.
A TV Globo teve acesso ao que Monark falou aos policiais que investigam o caso. O depoimento ocorreu no 4º Distrito Policial (DP), na Consolação, porque o 78º DP, nos Jardins, que investiga o caso, está em reformas. As duas delegacias ficam no Centro da capital paulista.
Monark é investigado criminalmente por suspeita de ter infringido o artigo 20 da lei 7.716, de janeiro de 1898, que pune com “reclusão de uma a três anos e multa” quem “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.”
O Ministério Público (MP) acompanha de fora a investigação policial e apura o caso nas esferas criminal e cível. A reportagem não conseguiu localizar Monark ou sue defesa para comentarem o assunto até a última atualização desta reportagem.
‘Acontecimento horrível e reprovável’
Investigado por defender a existência de um partido nazista no Brasil, o influencer Bruno Aib, conhecido como Monark, alegou em depoimento à Polícia Civil, nesta quarta-feira (9), que “tem conhecimento superficial” sobre o nazismo. No depoimento, não citou, porém, que estava bêbado quando deu a declaração – argumento usado por ele ao pedir desculpas na ocasião.
Monark e os responsáveis pelo Flow Podcast, canal de entrevistas na internet, são investigados por apologia do nazismo e discriminação contra judeus.
‘Acontecimento horrível e reprovável’
Na esfera criminal, a Promotoria Criminal e a Polícia Civil vão apuram se Monark e o Flow Podcast usaram a web para defender o nazismo e discriminar judeus. Em caso de eventual condenação na Justiça, eles podem receber pena de prisão ou pagar multa.
Em fevereiro, Monark havia dito que queria um “partido nazista reconhecido pela lei” e que “se um cara quisesse ser antijudeu, eu acho que ele tinha o direito de ser”.
Nesta quarta, ele justificou as declarações acima dizendo aos policiais que investigam o caso que possui apenas o “ensino médio” e que “tem um conhecimento superficial a respeito do nazismo”.
“O declarante trabalhava como entrevistador, sendo que não tem formação acadêmica, possuindo o ensino médio completo; Que esclarece o declarante que tem conhecimento superficial a respeito do nazismo, tendo o entendimento que foi um acontecimento horrível e reprovável; Que afirma o declarante que não tem qualquer preconceito de raça, etnia, religião ou procedência”, informa trecho do depoimento que Monark deu aos policiais na delegacia.
Monark não citou à polícia que estava ‘bêbado‘
Antes de ser ouvido pela polícia, Monark chegou a se desculpar em fevereiro num vídeo postado em sua rede social (veja acima) dizendo que estava “bêbado” durante sua participação no programa e pediu a compreensão de todos:
“Ó galera, eu queria fazer esse vídeo pra só pedir desculpa mesmo porque eu errei, a verdade é essa, eu tava muito bêbado”. “Eu peço também um pouco de compreensão, são 4 horas de conversa”, disse Monark no mês passado.
Mas em seu depoimento à investigação policial não há menção a esse fato de que estaria bêbado quando deu as declarações de cunho racista.
Aos policiais, Monark falou alegou dessa vez que usou em uma frase, “de maneira infeliz”, a declaração de que “não houvesse uma lei que proibisse a criação de um partido nazista” já que “dentro de tal dinâmica”, “a esquerda radical” tem um “partido comunista” no Brasil.
“Foi uma abordagem infeliz”, disse o influencer, que contou à polícia que “jamais teve a intenção de ofender o povo judeu”.
E continuou, dizendo que “entende” o que ocorreu como “uma frase infeliz e fota do contexto” e que “jamais teve a intenção de incentivar o racismo/nazismo, não compactuando com tal entendimento, ressaltando que a ideia do programa era justamente combater o racismo”.
Esfera cível
Na esfera cível, a Promotoria de Direitos Humanos investiga se Monark e o Flow Podcast usaram a internet para divulgar a defesa do nazismo e discriminação por procedência nacional. O Ministério Público pedirá à Justiça que os investigados paguem uma indenização, ainda a ser estipulada, por terem ofendido toda a comunidade judaica. Não caberia prisão nesse caso.
No entendimento dos promotores, há indícios de que o influencer e o programa cometeram dano social e dano moral coletivo contra o povo judeu.
Em outras palavras, segundo a Promotoria, Monark e o Flow Podcast ofenderam todas as vítimas do Holocausto, que foi o genocídio de 6 milhões de judeus pela Alemanha do governante Adolf Hitler durante a Segunda Guerra Mundial.
Em caso de eventual condenação pelos danos causados, os investigados teriam de pagar quantias em dinheiro para um fundo que trataria sobre como combater discursos de ódio.
Investigações por Polícia, MP-SP e MPF
Além de Monark, os responsáveis pelo Flow Podcast também serão chamados pelas duas promotorias e pela Polícia Civil para explicarem a declaração do influencer, de que deveria haver um “partido nazista reconhecido pela lei” e que “se um cara quisesse ser antijudeu, eu acho que ele tinha o direito de ser”.
As palavras foram ditas por Monark durante conversa com os deputados federais Kim Kataguiri (DEM-SP) e Tabata Amaral (PSB-SP):
- Monark: “Eu acho que o nazista, tinha que ter o partido nazista reconhecido pela lei”. ” A questão é, se o cara quiser ser um antijudeu, eu acho que ele tinha o direito de ser.”
- Tabata: “Kim, você acha que é errado a Alemanha ter criminalizado o nazismo?”
- Kim: “acho!”
O Ministério Público Federal (MPF), em Brasília, também investiga Monark por apologia ao nazismo após determinação do procurador-geral Augusto Aras. Mas além do influencer, a Procuradoria apura se Kim cometeu o mesmo crime por entender que ele fez declarações de cunho neonazista ao responder a Tabata que a Alemanha não deveria ter criminalizado o nazismo:
Em São Paulo, no entanto, as duas promotorias do Ministério Público estadual vão apurar somente a participação de Monark e o Flow Poadcast no caso de apologia do nazismo. Kim tem foro privilegiado por ser parlamentar.
Adrilles investigado por gesto
Adrilles Jorge — Foto: Reprodução
Ainda na capital paulista, o Grupo Especial de Combate aos Crimes Raciais e de Inteligência (Gecradi) do Ministério Público abriu em fevereiro investigação criminal contra o comentarista Adrilles Jorge por fazer um gesto apontado como saudação nazista durante sua participação num programa da TV Jovem Pan News, no mês passado.
O gesto ocorreu após debate sobre as declarações de Monark. Adrilles foi demitido pela empresa após o episódio.
Direitos humanos
Segundo a Promotoria de Direitos Humanos de São Paulo, o programa foi transmitido ao vivo pelo YouTube para 400 mil pessoas em 7 de fevereiro e “o conteúdo nazista e antissemita é inquestionável”.
“A criação de um partido nazista (…) é proibido pelo ordenamento jurídico brasileiro”, informa documento do Ministério Público assinado pelos promotores Anna Trotta Yaryd e Reynaldo Mapelli Júnior. “O discurso discriminatório contra judeus excede os limites da liberdade de expressão”.
“A liberdade de expressão não comporta discurso de ódio, manifestação de racismo ou a prática de discriminação contra grupos sociais específicos”, continua a portaria que determinou a abertura de inquérito cível contra Monark e a Flow Podcast.
Kim Kataguiri
O deputado Kim Kataguiri, por sua vez, também se defendeu ao dizer que foi “antinazista” durante o programa, mas não se posicionou quanto ao fato de ter criticado a proibição da existência de partidos nazistas na Alemanha:
- Kim: “Estou fazendo esse vídeo para deixar o mais claro possível a minha posição e rechaçar, refutar e rebater todos aqueles que estão difundindo calunias aí contra mim dizendo que eu sou nazista quando todo o meu discurso foi antinazista, foi para trabalhar e pra expor uma maneira de derrotar e sufocar um nazismo da melhor maneira possível”.
Retirada de vídeo do ar
GNews – Ministério Público de SP — Foto: globonews
O Ministério Público de São Paulo ainda determinou que o Youtube retirasse do ar o vídeo no qual Monark é investigado por apologia do nazismo.
Repercussão
As declarações de Monark sobre o nazismo repercutiram imediatamente na internet, gerando uma onda de críticas.
O coletivo Judeus e Judias pela Democracia São Paulo entrou com um pedido para que o Ministério Público estadual investigasse o caso e a suspeita de prática de crimes como apologia do nazismo, incitação à violência, injúria racial e intolerância religiosa durante a transmissão do podcast.
Após a repercussão do caso, os Estúdios Flow divulgaram uma nota informando que Monark “está desligado” da empresa e que o episódio em questão será retirado do ar. A nota não informou mais detalhes sobre como se deu o desligamento — Monark é sócio-administrador dos Estúdios Flow.
Segundo o Sleeping Giants Brasil, perfil no Twitter que busca a tirada de financiamento de meios e programas que propagam discurso de ódio, o Flow Podcast já perdeu seis patrocinadores.
FONTE: Por G1 AM