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Exclusivo: “Ligações relâmpago” induziram descontos no INSS

Decisões judiciais responsabilizam associações por abordagem vista como "má-fé" e "prática abusiva”

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Edfício sede do INSS, em Brasília • Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

Noventa segundos. Esse foi o tempo que bastou para a entidade “Cebap” garantir um desconto de R$ 45 mensais na aposentadoria de uma mulher de 73 anos. A fala do call center da associação tem trechos inaudíveis e outros em que ela é induzida a completar dados como data de nascimento e CPF.

O áudio da ligação foi usado como suposta prova de adesão a um benefício que a aposentada nunca havia solicitado. Mas não colou.

Um outra ligação, feita a uma aposentada de 79 anos, a atendente da Unsbras até chega a completar os dados da mulher, como o ano de nascimento e o CPF. O faz porque já os têm em mãos. A forma como eles conseguiram as informações pessoais da idosa é uma incógnita para advogados, uma vez que os dados não são públicos e são protegidos pela Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais.

A atendente lê um termo de consentimento. A ligação fica distante e o áudio praticamente incompreensível. Ainda assim, a entidade dá como certo o desconto e passa a debitar valores todos os meses dos pagamentos da aposentadoria da idosa.

Em 1 minuto e 49 segundos, a Ambec consegue amarrar a adesão de outro aposentado de 66 anos. A atendente sabe até o número do benefício do idoso, fala frases corridas, com palavras emboladas e no final dos textos sempre pergunta “confirma?”.

Para a advogada Layane Botelho, especialista em direito bancário, a abordagem acelerada mostra como as práticas abusivas foram institucionalizadas e generalizadas por anos pelas entidades vinculadas ao INSS.

Layane sustenta que essa prática já se tornou “quase institucionalizada”. “Esses descontos inseridos automaticamente no benefício previdenciário reduzem, sem sombra de dúvidas, a capacidade de compra dessa pessoa, que já sobrevive com muito pouco”, disse ela à CNN.

Até agora, mais de 2 milhões de aposentados e pensionistas já relataram ao INSS descontos indevidos em seus benefícios. O órgão ainda não divulgou como e nem quando vai devolver os valores totais. As primeiras devoluções começam nesta segunda (25).

Decisões judiciais

Em uma das decisões sobre o tema, o juiz Pedro Henrique Valdevite Agostinho, da comarca de Guaíra, no interior de São Paulo, não só critica mas invalida a abordagem feita por telefone.

“O áudio é incompreensível em sua maior parte, sendo que o atendente da ré [a entidade] apenas realiza, de forma extremamente veloz e sem pausas, a leitura de algumas condições da contratação, sem tratar de informações relevantes, como valor, forma de pagamento, condições de cancelamento etc”, diz ele, sugerindo “má-fé” e “prática abusiva”, o que viola o Código de Defesa do Consumidor.

A visão é semelhante ao do juiz Humberto Rocha, da comarca da Franca (SP), que condena outra associação a pagar indenização para um idoso considerando que os descontos indevidos configuram dano moral. Ele também critica a forma da abordagem e o tempo da ligação.

“É certo que a requerida somente se preocupou, por meio do seu serviço de call center, de vender o serviço/produto, em razão do tempo ínfimo da ligação, não sendo crível que o consumidor tenha condições de, nesse exíguo espaço de tempo, ter ciência de todos os termos e peculiaridades de um contrato extremamente complexo como o ofertado pela requerida”, sustenta o magistrado.

O que diz o INSS

CNN questionou o INSS sobre os contatos por telefone. Em nota, o órgão disse que “não autoriza qualquer tipo de abordagem irregular, como ‘ligações relâmpago’, confusas ou que induzam o segurado ao erro para a efetivação de descontos em seus benefícios”.

Eles ressaltam ainda que “as normativas do INSS são claras quanto à necessidade de autorização expressa do titular do benefício para a efetivação de qualquer desconto de mensalidade associativa”.

Outro lado

CNN também entrou em contato nos e-mails disponíveis nos sites da Ambec, Unsbras e Cebap. O contato foi feito na última quinta-feira (22) e reforçado no domingo (25). Nenhuma das três respondeu aos nossos contatos.

Também questionamos o INSS sobre a validade das “ligações relâmpago” para que o dinheiro fosse retirado dos aposentados. A reportagem aguarda o posicionamento do órgão sobre esse tema em específico.

FONTE: Por CNN

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