A pequena Sofia Nascimento, de 5 anos, acorda todos os dias às 5h30, para ir à escola. Ela mora em um sítio na Zona Rural de Manaus e precisa pegar um barco e caminhar em um trajeto para chegar na unidade de ensino, que fica na comunidade São Sebastião. Tudo isso, para conseguir ter acesso à educação em uma região onde a vida depende da ação da natureza.
Na Zona Rural de Manaus, o calendário letivo segue datas diferentes da capital. As aulas acontecem no período de cheia do Rio Negro, quando o barco que leva os estudantes às escolas consegue chegar nas casas e levar os alunos até onde estudam.
Já no período de vazante do Rio Negro, o barco não consegue se aproximar das casas e das escolas, o que dificulta o trajeto dos alunos. Por esse motivo, as aulas começam logo no início de janeiro e terminam em outubro.
A Sofia conta com a ajuda da mãe, Edileia Nascimento, que arruma o cabelo da filha, põe o uniforme e caminha até a beirada do rio, para esperar o barco da escola, todos os dias. Rotina que a mãe já viveu quando criança e, hoje, vê a filha poder ter acesso ao estudo.
Na época em que Edileia estudava, ela lembrou que o local era um galpão que tinha apenas algumas cadeiras, onde os alunos se reuniam. Hoje, a pequena Sofia estuda na Escola Municipal São Sebastião II, na comunidade São Sebastião, que foi revitalizada e tem várias salas de aula.
“A gente já está acostumada a essa rotina. A escola está uma maravilha. Do que era antes, para o que está agora, está ‘top’. É gratificante saber que ela já tem esse gosto de estudar. Acordar cedo, tomar banho com aquela água gelada. Eu sinto orgulho dela por querer estudar e ser alguém na vida, porque sem estudo não somos nada”, afirmou Edileia.
Logo após o barco chegar, a mãe entrega Sofia para os auxiliares da escola e segue a caminho de mais um dia de aula. Em pouco mais de 10 minutos, ela atravessa o trajeto pelo Rio Negro entre sua casa e a escola.
Questionada sobre o que acha de sua escola e poder estudar, Sofia afirmou que “Acha legal” e que barco que a leva para a aula é “muito bonito”. “Eu já consigo fazer o meu nome. Sofia Helena”, disse.
Após seu dia de aula, junto com outros dois colegas de classe, a Sofia volta para onde o barco a espera e segue para casa, para descansar e esperar pelo próximo dia. É dessa maneira que os estudantes da Zona Rural de Manaus vivem.
Sofia estuda na Escola Municipal São Sebastião, na Zona Rural de Manaus. — Foto: Patrick Marques/g1 AM
Aulas na Zona Rural
Em 2023, as aulas começaram dia 9 de janeiro e devem seguir até o mês de outubro, quando os barcos não conseguem mais chegar até as casas dos estudantes e das escolas, conforme a chefe da Divisão Rural da Semed, Rosa Diniz.
“Nós não temos nenhum recesso nesse período e também temos os sábados letivos, respeitando o que preconiza a Lei de Diretrizes e Bases da educação (LDB). Os 200 dias letivos, 800 horas de aula. É um calendário diferenciado para a Zona Rural, ribeirinha, do Rio Negro”, informou.
Ela explicou que o melhor período para que as aulas aconteçam é durante a cheia do Rio Negro, quando as embarcações conseguem fazer o transporte dos estudantes. Com a seca, a escola se distancia das crianças.
“As crianças não podem passar para correr perigo nas lamas, igapós. Então, as aulas tem que terminar mais cedo para a gente ter essa segurança com eles. Tem crianças que ficam a três quilômetros, quatro quilômetros distante. A seca do rio é muito severa, como foi em 2022”, explicou Diniz.
Ainda conforme a chefe da Divisão Rural da Semed, por saber como a área fica devido a ação natureza, os gestores já costumam se preparar durante os períodos e as crianças já se habituaram a estudar no calendário diferente do que é praticado nas escolas da capital.
Rotina na Escola
A Escola Municipal São Sebastião II, na comunidade São Sebastião, recebe alunos nos turnos matutino e vespertino. Parte dos estudantes mora na comunidade e outros, moram em comunidades da região e são transportados todos os dias pelo barco da instituição.
Ao total, 50 alunos da região estudam na escola, nos dois períodos. Dezessete deles moram nas comunidades vizinhas e precisam ser transportados de barco para chegarem até a escola.
Segundo o diretor da escola, Robson Melo, na Zona Rural, os gestores conseguem ter uma proximidade maior com os alunos e também com os pais, para que estejam cientes sobre as condições dos estudantes.
Aulas na Escola Municipal São Sebastião tiveram início dia 9 de janeiro, na Zona Rural de Manaus. — Foto: Patrick Marques/g1 AM
“A escola procura, de todas as maneiras, fazer com que os estudantes não desistam. A gestão, os assessores vamos atrás dos alunos, procuramos os pais. Temos uma integração melhor com a família. A gente consegue ter uma proximidade diferente da urbana”, explicou o diretor.
Pelo menos 29 escolas de áreas ribeirinhas do rio negro cumprem um calendário próprio pra evitar que os alunos enfrentem as dificuldades do pico da vazante das águas. O estudante Jonas Vasconcelos, de 11 anos, mora na região e já viveu o cenário difícil.
“É muito difícil, porque a gente tem que enfrentar a lama. A gente tem que enfrentar um monte de coisa para vir para a escola”, comentou o aluno, que afirmou amar ir para a escola de barco durante o período de cheia.
FONTE: Por G1 AM