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Haiti: com quase 20 governos em 35 anos, país tem sucessão incerta após assassinato de presidente

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REUTERS Legenda da foto, Jovenel Moïse governava desde 2017, sob crescentes protestos, em um país onde uma crise política sucede a outra

O assassinato do presidente do Haiti, Jovenel Moïse, pode colocar o país mais pobre do Ocidente em uma nova espiral de instabilidade e caos, em meio a incertezas sobre quem o sucederá.

Moïse foi morto a tiros na residência oficial durante a madrugada, segundo informou o premiê interino Claude Joseph, que decretou estado de emergência no país de 11 milhões de habitantes e se disse no comando.

“Meus compatriotas, permaneçam calmos porque a situação está sob controle”, declarou Joseph em pronunciamento na TV.

Mas, em um país cada vez mais polarizado, com pobreza latente e vivendo há meses sob o aumento da violência de gangues na capital Porto Príncipe, cresce o medo de que se avizinhe mais um período grave de crises.

Não está claro como ficará o governo com a morte do presidente. Ele havia recém-nomeado um novo premiê, Ariel Henry, que não chegou a tomar posse oficialmente.

O chefe da Corte Suprema do Haiti, que também seria um possível sucessor sob as regras da Constituição do país, morreu no mês passado de covid-19 e ainda não foi substituído.

Antes do assassinato de Moïse, Airel Henry havia dito em entrevista à agência France Presse que sua prioridade, segundo ordem emitida pelo presidente, seria a preparação de novas eleições em um “ambiente favorável”.

Moïse, que antes de entrar para a política era um exportador de banana, estava no poder desde 2017, mas enfrentava crescentes protestos por acusações de corrupção e pela deterioração econômica do país.

Neste ano, líderes da oposição acusaram-no de tentar instalar uma nova ditadura no Haiti, ao endurecer a repressão a protestos e tomar medidas consideradas autoritárias — algo que ele negava.

Moïse vinha governando por decreto havia mais de um ano, depois de ter dissolvido o Parlamento e o país fracassar em realizar eleições legislativas.

O presidente ainda tentou promover uma polêmica reforma constitucional que, segundo ele, ajudariam a conter a instabilidade da política haitiana.

Em fevereiro deste ano, chegou a haver um ultimato de setores da oposição, advogados, acadêmicos e igrejas para Moïse deixar o cargo, tendo em vista que seu mandato de cinco anos estava perto do fim. Ele respondia que planejava se manter no poder até 2022.

Palco de devastação constante pela passagem de furacões e ainda sofrendo com os efeitos do intenso terremoto de 2010, o Haiti já teve quase 20 governos nos últimos 35 anos, entre líderes militares, presidentes eleitos ou interinos, conselhos de ministros ou governos de transição.

Palco de devastação constante pela passagem de furacões e ainda sofrendo com os efeitos do intenso terremoto de 2010, o Haiti já teve quase 20 governos nos últimos 35 anos, entre líderes militares, presidentes eleitos ou interinos, conselhos de ministros ou governos de transição.

Desde que a dinastia Duvalier foi derrubada, em 1986, o Haiti sofre sucessivas crises de poder, eleições contestadas, intervenções e golpes de Estado, que a tornam a nação do continente que teve mais governos (não parlamentaristas) no menor intervalo de tempo desde o final do século 20.

De ‘Papa Doc’ a Jovenel Moïse

François “Papa Doc” Duvalier tomou posse em um golpe militar em 1957 e fez um governo linha-dura, com amplos abusos aos direitos humanos, até 1971, quando morreu e foi sucedido por seu filho, Jean-Claude, o “Baby Doc”.

Ele aumentou a repressão no país, mas foi forçado a se exilar em 1986, após intensa pressão popular.

Mural de Moïse em Porto Príncipe
Legenda da foto,Mural de Moïse em Porto Príncipe; presidente governava por decreto havia um anos

Começou aí um período (que ainda não terminou) de disputas de poder, rebeliões e trocas constantes de governo.

Uma missão de paz da Organização das Nações Unidas (ONU), protagonizada pelo Brasil, foi levada ao Haiti com o objetivo de restaurar a ordem após uma rebelião que derrubou o então presidente Jean-Bertrand Aristide e terminou em 2019 (a participação do Brasil foi até 2017).

Isso, embora tenha ajudado o país na transição à democracia, não foi capaz de solucionar o caos político.

Nesse interim, houve o catastrófico terremoto de 2010, que deixou entre 100 mil e 300 mil mortos, segundo diferentes contagens, e causou estragos profundos (e ainda não sanados) no país, exacerbando os problemas políticos, sociais e econômicos.

A instabilidade se manteve com o governo de Moïse, que defendia que seu mandato deveria terminar apenas em 7 de fevereiro de 2022, enquanto críticos queriam que ele tivesse deixado o poder em 7 de fevereiro deste ano.

A divergência temporal se deve ao fato de que Moïse foi eleito inicialmente em 2015, mas a votação foi anulada por suspeitas de fraude. Ele venceu o novo pleito em novembro de 2016.

As eleições legislativas, por sua vez, foram sucessivamente adiadas. Sem um Parlamento, a crise política se aprofundou em 2020, enquanto Moïse governava por decreto.

Com seu assassinato, o Conselho de Segurança da ONU convocou uma reunião de emergência a respeito do Haiti. O órgão, bem como Estados Unidos e países da Europa, pediram que o Haiti realize eleições legislativas e presidenciais “justas e transparentes” até o final deste ano.

Antonio Guterres, secretário-geral da ONU, pediu que os haitianos “permaneçam unidos diante do terrível ato (desta quarta) e rejeitem a violência”.

FONTE: Com reportagem da Reuters, da France Presse e de Lioman Lima, da BBC News Mundo.

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